sexta-feira, 24 de junho de 2022

Proteção de Sistemas Elétricos de Potência


 ELEMENTOS DA PROTEÇÃO 


1.1 INTRODUÇÃO 

Na operação dos sistemas elétricos de potência surgem, com certa frequência, falhas nos seus componentes que resultam em interrupções no fornecimento de energia aos consumidores conectados a esses sistemas, com a consequente redução da qualidade do serviço prestado. 

A falha mais comum em qualquer sistema de potência é o curto-circuito, que dá origem a correntes elevadas circulando em todos os elementos energizados, tendo como resultado severos distúrbios de tensão ao longo de todo o sistema elétrico, ocasionando, muitas vezes, danos irreparáveis ao sistema e às instalações das unidades consumidoras. 

Além do curto-circuito, a sobrecarga é outro fator de anormalidade nos sistemas de potência que pode originar danos materiais significativos. 

Além desses, existem outros dois fenômenos, não menos severos, que podem ocorrer nos sistemas elétricos: as sub e sobretensões com diferentes origens, de descargas atmosféricas e manobras, entre outras. Algumas vezes estão associadas aos curtos-circuitos. 

Os curtos-circuitos, as sobrecargas e as sub e sobretensões são inerentes ao funcionamento dos sistemas de potência, apesar das precauções e cuidados tomados durante a elaboração do projeto e a execução das instalações, mesmo seguindo as normas mais severas e as recomendações existentes. 

Essas anormalidades poderão ter consequências irrelevantes ou desastrosas, dependendo do sistema de proteção preparado para aquela instalação em particular. 

A principal função de um sistema de proteção é assegurar a desconexão de todo sistema elétrico submetido a qualquer anormalidade que o faça operar fora dos limites previstos ou de parte dele. 

Em segundo lugar, o sistema de proteção tem a função de fornecer as informações necessárias aos responsáveis por sua operação, de modo a facilitar a identificação dos defeitos e a sua consequente recuperação. 

De modo geral, a proteção de um sistema de potência é projetada tomando como base os fusíveis e os relés incorporados necessariamente a um disjuntor, que é, na essência, a parte mecânica responsável pela desconexão. do circuito afetado com a fonte supridora. 

O fusível representa uma gama numerosa de dispositivos que são capazes de interromper o circuito ao qual estão ligados, sempre através da fusão de seu elemento metálico de proteção. 

São normalmente empregados nos sistemas de distribuição de média tensão e muito raramente nos sistemas de alta tensão, devido à sua baixa confiabilidade e à dificuldade de se obter sistemas seletivos. 

Os leitores poderão obter informações técnicas sobre construção e funcionamento de fusíveis no livro do autor Manual de Equipamentos Elétricos, 34 edição. 

Já os relés representam outra gama de dispositivos, com as mais diferentes formas de construção e funções incorporadas, para aplicações diversas, dependendo da importância, do porte e da segurança da instalação con-siderada. 

Os relés sempre devem atuar sobre o equipamento responsável pela desconexão do circuito elétrico afetado, normalmente o disjuntor ou o religador. A detecção de um defeito em um sistema elétrico é obtida, de forma geral, pela aplicação de um dos seguintes critérios: 

• Elevação da corrente. 

• Elevação e redução da tensão. 

• Inversão do sentido da corrente. 

• Alteração da impedância do sistema. 

• Comparação de módulo e ângulo de fase na entrada e na saída do sistema.

Para melhor compreensão das características de funcionamento de uma estrutura de proteção, descreveremos algumas definições de termos clássicos utilizados no cotidiano dos técnicos que trabalham nesse segmento: 

• Corrente nominal: é o valor da corrente secundária que pode circular permanentemente no relé. 

• Corrente de ajuste: é o valor da corrente ajustada no relé, acima da qual o relé atuará. 

• Corrente de acionamento: é o valor da corrente que provoca a atuação do relé de proteção. 

• Corrente máxima admissível: é o valor máximo da corrente que pode suportar os componentes do relé, tais como bobinas, contatos, elementos eletrônicos etc., durante um tempo especificado. 

• Consumo: é o valor da energia solicitada pelo relé aos equipamentos de medida aos quais está conectado, durante o seu funcionamento. 

• Potência nominal: é o valor da potência que é requerida pelo relé e fornecida pelos transformadores de potencial e de corrente. 

• Tensão nominal: é o valor da tensão para o qual foi isolado o dispositivo. • Tensão de serviço: é a tensão do sistema ao qual o relé está conectado. • Tensão máxima admissível: é o valor da tensão máxima a que pode ficar submetido o relé em operação. 

• Temporização: é o valor do tempo, normalmente em segundos, ajustado no relé, para o qual o mesmo atuará. 

1.2 ESTRUTURA BÁSICA DE UM SISTEMA DE PROTEÇÃO 

De forma geral, o esquema básico de funcionamento de um relé de proteção pode ser entendido pela ilustra-ção da Figura 1.1, que descreve os seus diversos componentes. 

a) Unidade de entrada 

Corresponde aos equipamentos que recebem as informações de distúrbios do sistema elétrico, tais como transformadores de corrente e de potencial, e enviam esses sinais à unidade de conversão do relé de proteção. As unidades de entrada também oferecem uma isolação elétrica entre o sistema e os dispositivos de proteção, evitando que tensões e correntes elevadas sejam conduzidas a esses dispositivos. 

b) Unidade de conversão de sinal 

É o elemento interno aos relés que recebe os sinais dos transformadores de corrente e de potencial e os transforma em sinais com modulação adequada ao nível de funcionamento dos relés. A unidade de conversão é própria da proteção com relés secundários — estudaremos esse assunto mais adiante. Na proteção com relés primários não existe a unidade de conversão, já que a corrente e/ou a tensão da rede são aplicadas diretamente sobre a unidade de disparo do disjuntor. 

c) Unidade de medida 

Ao receber os sinais da unidade de conversão, a unidade de medida compara as suas características (módulos da corrente e tensão, ângulo de fase, frequência etc.) com os valores que foram previamente armazenados 

 

Figura 1.1 Esquema básico de funcionamento de um relé de proteção. 

nela e tidos como referência de operação. Caso os sinais de entrada apresentem valores superiores aos valores previamente ajustados, a unidade de medida envia um sinal à unidade de saída. 

d) Fonte de tensão auxiliar 

É a unidade que fornece energia às unidades de medida para processar as informações e à unidade de saída. Também fornece energia à unidade de acionamento, às vezes constituída por uma pequena bobina que aciona um contato auxiliar. Em geral, a fonte auxiliar é constituída por uma bateria. Em alguns dispositivos de proteção, a fonte auxiliar pode ser constituída por um circuito interno que converte a corrente que chega da unidade de entrada numa pequena tensão através da queda de tensão propiciada por um resistor instalado internamente ao dispositivo de proteção. 

e) Unidade de saída 

Pode ser constituída por uma pequena bobina acionando um contato auxiliar ou por uma chave semicondutora. 

f) Unidade de acionamento 

Normalmente é constituída por uma bobina de grossas espiras montada no corpo do elemento de desconexão do sistema, que pode ser um disjuntor ou um interruptor. A unidade de acionamento é característica dos sistemas de proteção com relés secundários. Na proteção com relés primários, a unidade de acionamento é ativada diretamente pelas unidades de entrada. 

A partir dessa abordagem geral, podemos apresentar uma visão geral de uma estrutura de proteção, detalhada na Figura 1.2. 

Veja a seguir a descrição sumária do funcionamento desses dispositivos. 

• TC — transformador de corrente: equipamento responsável pelo suprimento da corrente ao elemento de avaliação da corrente (A) que se quer controlar. 

• TP — transformador de potencial: equipamento responsável pelo fornecimento da tensão ao elemento de avaliação da tensão (A) que se quer controlar. 

• D — interruptor ou disjuntor responsável pela desconexão do sistema. 

• F — fonte auxiliar de corrente que supre os diversos elementos envolvidos na proteção. Em geral, trata-se de uma fonte de corrente contínua. 

• A — elemento de avaliação das medições de corrente e tensão que tem as seguintes funções: — gerenciar as condições operacionais do componente elétrico protegido, tais como a linha de transmissão, o transformador de potência etc.; decidir, a partir dos valores recebidos de corrente e tensão, as condições em que se dará a operação de desconexão. 

• B — elemento lógico da estrutura de proteção; recebe as informações do elemento de avaliação, procede à comparação com os valores ajustados e, se for o caso, libera o sinal de atuação para o interruptor ou disjuntor. 

• C — elemento que modula o sinal de disparo do interruptor ou disjuntor. 

• S — elemento de sinalização ótica ou visual de todas as operações realizadas na estrutura básica de proteção. 

 

Figura 1.2 Estrutura básica de um esquema de proteção. 

• K — elemento responsável pela recepção de sinais de comando originados ou não de outros pontos distantes da parte do sistema sob proteção; pode ser a própria régua de borne dos condutores dos circuitos de proteção. 

Em alguns esquemas de proteção, os transformadores de potencial podem ser suprimidos, como no caso da proteção de sobrecorrente. Quando se tratar somente da proteção de sub e sobretensão, não é necessária, no entanto, a aplicação do transformador de corrente. E, finalmente, em alguns esquemas de proteção utilizando relés primários, não é necessário empregar nenhum transformador de medida. 

1.3 FALHAS DE UM SISTEMA DE POTÊNCIA 

Como já comentado anteriormente, os curtos-circuitos correspondem às falhas mais severas que ocorrem num sistema elétrico de potência. São eventos resultantes de um defeito na isolação de um ponto qualquer sob tensão da rede considerada ou de uma ação involuntária sobre o sistema. Como consequência direta são obtidos valores de corrente extremamente elevados, capazes de provocar danos irreparáveis à instalação se não houver correta interferência do sistema de proteção. Os curtos-circuitos podem se dar entre as três fases, entre duas fases quaisquer, compreendendo ou não a terra, e entre uma fase qualquer e a terra. 

As sobrecargas são caracterizadas pela elevação moderada da corrente, acima dos valores admitidos no projeto. Ao contrário dos curtos-circuitos, as sobrecargas não constituem uma falha de instalação, mas sim um procedimento muitas vezes incorreto de sua operação, seja pela aquiescência de introdução de uma nova carga no circuito, seja pelo aumento da carga mecânica admitida no eixo dos motores etc. Enquanto os curtos-circuitos são de curta duração, em geral as sobrecargas são prolongadas. 

1.3.1 Estatísticas das interrupções 

As concessionárias de energia elétrica, geradores e distribuidores, acompanham e avaliam rigorosamente as interrupções de seus sistemas, a fim de se orientarem no planejamento estratégico e operacional, objetivando melhorar a qualidade de fornecimento de energia a seus clientes. A seguir veremos alguns dados médios das interrupções dos sistemas de geração e transmissão relativos ao sistema elétrico brasileiro. 

a) Causas das interrupções 

• Fenômenos naturais: 48%. 

• Falhas em materiais e equipamentos: 12%. 

• Falhas humanas: 9%. 

• Falhas diversas: 9%. 

• Falhas operacionais: 8%. 

• Falhas na proteção e medição: 4%. 

• Objetos estranhos sobre a rede: 4%. 

• Condições ambientais: 6%. 

b) Origem das interrupções 

• Linha de transmissão: 68%. 

• Rede de distribuição: 10%. 

• Barramento de subestação: 7%. 

• Transformador de potência: 6%. 

• Gerador: 1%. 

• Próprio sistema: 4%. 

• Consumidor: 4%. 

c) Duração das interrupções (T em minutos) 

• 1 < T < 3: 57%. 

• 3 < T <15: 21%. 

• 15 < T< 30:6%. 

• 30 < T < 60: 4%. 

• 60 < T < 120: 3%. 

• T > 120: 9%. 

As interrupções também podem ser contabilizadas ao longo dos meses do ano, o que varia em cada região dependendo, principalmente, das condições climáticas. Podem-se acrescentar a essas estatísticas as interrupções quanto ao tipo de curto-circuito: 

• Curto-circuito trifásico: 8%. 
• Curto-circuito bifásico: 14%. 
• Curto-circuito fase e terra: 78%.
 
Existe um tipo de interrupção bastante característico dos sistemas de distribuição, urbano ou rural, denominado defeito fugitivo. Corresponde à falta monopolar à terra de curtíssimo tempo, como, por exemplo, a palha de uma palmeira tocando os condutores de uma rede aérea devido a uma rajada moderada de vento. As estatísticas mostram que cerca de 80% do total das interrupções são classificadas como fugitivas.
 
1.3.2 Custos das interrupções As interrupções geram custos de duas naturezas, ou seja:
 
a) Custos financeiros 

Correspondem à perda de faturamento da concessionária devido à energia não vendida. 

b) Custo social 

Nesse caso há duas maneiras de avaliar a interrupção: 

• Custos financeiros do cliente. 

Perda de faturamento de sua unidade de negócio, no caso de atividades industriais e comerciais. 

• Custos com a imagem da concessionária junto aos seus clientes. 

É o investimento em marketing que a concessionária deve realizar para manter os seus clientes satisfeitos com o serviço que presta. Isso é importante quando há competitividade entre empresas do setor. 

Algumas concessionárias avaliam os custos financeiros resultantes das interrupções por meio de pesquisa direta com os consumidores. Esses custos variam de acordo com determinados períodos do dia, com o tempo da interrupção e com o tipo de classe do consumidor. Considerando a classe dos consumidores industriais, os custos das interrupções variam em função do tipo de atividade industrial exercida pelo consumidor. Nesse segmento, indicamos na Tabela 1.1 os valores médios nacionais dos custos das interrupções para diferentes horários e tempo de interrupção, tomados a partir do consumo mensal da indústria, ou seja, US$/MWh. 

Veja nas Tabelas 1.2 e 1.3 os custos das interrupções nos segmentos residenciais e comerciais. 

Deve-se ressaltar que os custos das interrupções no setor industrial decaem com a duração da interrupção, acentuando-se essa queda entre 30 e 60 minutos. Após a primeira meia hora, os custos praticamente se estabi-



lizam; isso porque é no início da interrupção que ocorrem as perdas de produção, com produtos danificados e muitas vezes irreparáveis. Determinadas indústrias, como a de tecelagem e a de cimento, ao serem atingidas por uma interrupção contabilizam perdas de produção independentes do tempo de duração da mesma até os 30 primeiros minutos. Essas indústrias normalmente necessitam de um tempo elevado de recuperação do ritmo de produção. As indústrias têxteis somente retornam à sua produção normal cerca de 3 horas após iniciados os procedimentos operacionais de partida. Já na indústria de cimento, esse tempo é cerca de 5 horas. 

Estudos realizados indicam que as interrupções que acarretam maior custo no setor industrial correspondem ao período entre o meio-dia e 16 horas. Já por volta da meia-noite, o custo das interrupções cai 40%. 

Ao longo da semana, durante os dias úteis, o custo das interrupções é praticamente constante. Nos fins de semana, sábados e domingos, os custos caem aproximadamente 35%. 

Veja as perdas médias do segmento comercial na Tabela 1.2, tomando como base o consumo mensal. 

1.4 REQUISITOS BÁSICOS DE UM SISTEMA DE PROTEÇÃO 

Um projeto de proteção deve considerar algumas propriedades fundamentais para se obter um bom desempenho: 

a) Seletividade 

Técnica utilizada no estudo de proteção e coordenação, por meio da qual somente o elemento de proteção mais próximo do defeito desconecta a parte defeituosa do sistema elétrico. 

b) Zonas de atuação 

Durante a ocorrência de um defeito, o elemento de proteção deve ser capaz de definir se aquela ocorrência é interna ou externa à zona protegida. Se a ocorrência está nos limites da zona protegida, o elemento de proteção deve atuar e acionar a abertura do disjuntor associado, num intervalo de tempo definido no estudo de proteção. Se a ocorrência está fora dos limites da zona protegida, o relé não deve ser sensibilizado pela grandeza elétrica do defeito ou, se o for, deve ter bloqueado o seu sistema restritor de atuação. 

c) Velocidade 

Desde que seja definido um tempo mínimo de operação para um elemento de proteção, a velocidade de atuação deve ser a de menor valor possível, a fim de propiciar as seguintes condições favoráveis: 
• Reduzir ou mesmo eliminar as aviaras no sistema protegido. 
• Reduzir o tempo de afundamento da tensão durante as ocorrências nos sistemas de potência. 
• Permitir a ressincronização dos motores. 

d) Sensibilidade 

Consiste na capacidade de o elemento de proteção reconhecer com precisão a faixa e os valores indicados para a sua operação e não operação. Para avaliar numericamente o nível de sensibilidade de um elemento de proteção, pode-se aplicar a Equação (1.1), ou seja: 

Iccmi, — corrente de curto-circuito em seu valor máximo, tomado no ponto mais extremo da zona de proteção, considerando a condição de geração mínima; 

Iac — corrente de acionamento do elemento de proteção, isto é, o valor mínimo da corrente capaz de acionar o referido elemento de proteção. Para conseguir um nível de sensibilidade adequada deve-se ter: 1,5 < Ns < 2. 

e) Confiabilidade 

É a propriedade de o elemento de proteção cumprir com segurança e exatidão, as funções que lhe foram confiadas. 

f) Automação 

Consiste na propriedade de o elemento de proteção operar automaticamente quando for solicitado pelas grandezas elétricas que o sensibilizam e retornar sem auxílio humano, se isso for conveniente, à posição de operação depois de cessada a ocorrência. Existem ainda outras propriedades fundamentais para o bom desempenho dos dispositivos de proteção: 

• Os relés não devem ser sensibilizados pelas sobrecargas e sobretensões momentâneas. 
• Os reles não devem ser sensibilizados pelas oscilações de corrente, tensão e frequência ocorridas natural-mente no sistema, desde que consideradas normais pelo projeto. 
• Os relés devem ser dotados de bobinas e circuitos de pequeno consumo de energia. 
• Os relés devem ter suas características inalteradas para diferentes configurações do sistema elétrico. 

1.5 DISPOSITIVOS DE PROTEÇÃO 

Existem dois dispositivos básicos empregados na proteção de sistemas elétricos de qualquer natureza: os fusíveis e os relés. 

Os fusíveis são dispositivos que operam pela fusão do seu elemento metálico construído com características específicas de tempo X corrente. Já os relés constituem uma ampla gama de dispositivos que oferecem proteção aos sistemas elétricos nas mais diversas formas: sobrecarga, curto-circuito, sobretensão, subtensão etc. 

Cada relé de proteção possui uma ou mais características técnicas que o definem para exercer as funções básicas, dentro dos limites exigidos pelos esquemas de proteção e coordenação, para cada sistema elétrico em particular. 

Os relés têm evoluído progressivamente desde que surgiu o primeiro dispositivo de proteção eletromecânico em 1901. Consistia em um relé de proteção de sobrecorrente do tipo indução. Por volta de 1908 foi desenvolvido o princípio da proteção diferencial de corrente, seguindo-se, em 1910, o desenvolvimento das proteções direcionais. Somente por volta de 1930 foi desenvolvida a proteção de distância. 

A qualidade e a complexidade da tecnologia dos dispositivos eletromecânicos evoluíram ao longo dos anos, permitindo que os esquemas de proteção alcançassem cada vez mais um elevado grau tanto de sofisticação quanto de confiabilidade. 

Na década de 1930 surgiram os primeiros relés de proteção com tecnologia à base de componentes eletrônicos, utilizando semicondutores. Os relés eletrônicos ou estáticos não alcançaram aceitação imediata no mercado, devido à forte presença dos relés eletromecânicos, que já nessa época eram fabricados com tecnologia de alta qualidade, robustez, praticidade e competitividade. Eram e ainda hoje são verdadeiras peças de relojoaria de precisão. 

Antes da introdução dos relés eletrônicos nos países tropicais, em função das elevadas temperaturas ambiente, esses relés não encontraram uma aceitação generalizada por parte dos profissionais de proteção, e essa tecnologia não chegou a ameaçar o mercado dos relés eletromecânicos. 

Na década de 1980, com o desenvolvimento acelerado da microeletrônica, surgiram as primeiras unidades de proteção utilizando a tecnologia digital. O mercado nacional não absorveu prontamente a tecnologia de proteção digital devido ao fracasso tecnológico das proteções eletrônicas, com as sucessivas falhas desses dispositivos. Algumas concessionárias, receosas com o uso dos relés digitais, chegaram a utilizá-los juntamente com os relés eletromecânicos corno proteção de retaguarda. Os limites de temperatura dos relés estáticos e em seguida dos relés digitais contribuíram muito para as falhas desses elementos de proteção. É que os reles secundários de indução de construção robusta, utilizados frequentemente em armários metálicos instalados ao tempo, resistiam às intempéries sem apresentar falhas graves de funcionamento. Já os relés estáticos e digitais construídos à base de componentes de alta sensibilidade às temperaturas elevadas muitas vezes foram utilizados em condições críticas em armários metálicos instalados no pátio das subestações, ocorrendo falhas graves de funcionamento. 

Pode-se afirmar que as vantagens dos relés eletrônicos sobre os eletromecânicos foram relativamente pequenas quando comparadas com as vantagens que os relés microprocessador levam sobre os eletromecânicos e os eletrônicos. 

Os relés eletromecânicos e eletrônicos são considerados dispositivos burros, enquanto os relés digitais incorporam todas as facilidades que à tecnologia dos microprocessadores oferece, além de preços competitivos e confiabilidade. 

É interessante observar que com o advento da tecnologia digital houve uma mudança brusca no conceito de tempo de vida útil de um sistema de proteção. Os relés eletromecânicos de-indução são equipamentos que pela sua construção robusta apresentavam uma vida útil de 20 a 30 anos. Já a vida útil dos relés digitais não é contada pelo tempo de desgaste de seus componentes eletrônicos, mas sim pelo tempo de obsolescência da tecnologia da informação que faz funcionar o relé. Assim, à medida que os softwares aplicados aos sistemas de proteção digitais adquirem maior poder de programação e lógica, é necessário desenvolver novos relés com a mesma função para poder se beneficiar desses aplicativos. 

Outra mudança sentida pelos profissionais de proteção está ligada à formação técnica. Na época dos relés eletromecânicos de indução, o tempo de treinamento de um técnico de nível médio para ajustar e realizar as manutenções necessárias no relé de um determinado fabricante se restringia a cerca de 10 horas. Com duas ou 3 horas adicionais, o mesmo técnico adquiria conhecimento suficiente para ajustar e realizar manutenção no mesmo tipo de relé de outro fabricante. Isso ocorria porque os relés de uma mesma função tinham construções muito semelhantes. Atualmente, o perfil técnico desses profissionais mudou significativamente. Agora, o tempo de treinamento de um técnico para ajustar e realizar manutenção num determinado tipo de relé digital de um fabricante pode durar semanas. Se esse mesmo técnico for chamado para realizar os mesmos serviços num relé de outro fabricante, mas com funções equivalentes, o tempo de treinamento é praticamente o mesmo. A situação atual dos relés de proteção pode ser resumida como descrito a seguir. 

1.5.1 Relés eletromecânicos de indução 

São equipamentos dotados de bobinas, disco de indução, molas, contatos fixos e móveis que lhes emprestam uma grande robustez. Dado o seu mecanismo de operação, são tidos como verdadeiras peças de relojoaria. São de fácil manutenção e de fácil ajuste dos parâmetros elétricos. As dimensões externas dos relés para cada função são padronizadas entre os fabricantes, de forma que o relé de sobrecorrente da GE poderia ser retirado do painel e substituído pelo relé de sobrecorrente da Westinghouse sem realizar praticamente nenhuma adaptação na instalação. 


Seus ajustes são realizados por meio de diais instalados sob a sua tampa de vidro, facilmente retirada. Algumas unidades operacionais necessitam de fontes de corrente elevada externa para realizar o seu ajuste. A sinalização operacional é do tipo mecânico, com o aparecimento de uma bandeirola vermelha indicando que a unidade operou. 

Atualmente, os relés eletromecânicos de indução não são mais fabricados. No entanto, existem ainda milhares desses dispositivos instalados nas subestações das concessionárias de energia elétrica, fábricas, prédios comerciais etc. São dispositivos com tempo de vida útil longo e somente são substituídos normalmente quando é feita alguma intervenção no sistema de proteção da subestação, motivada por reforma, ampliação ou necessidade de se alcançar melhor desempenho operacional. 

 Apesar da obsolescência tecnológica, ainda é muito útil do ponto de vista didático quando se procura ensinar os conceitos básicos de proteção. A tecnologia eletromecânica é facilmente explicável para definição das funções de proteção que o relé desempenha. Isso facilita a compreensão das funções dos relés digitais. A Figura 1.3 mostra um relé de sobrecorrente eletromecânico de indução.
 
1.5.2 Relés eletrônicos 

Também conhecidos como relés estáticos, tiveram o mesmo destino dos relés eletromecânicos de indução. Apresentam dimensões mais reduzidas do que as dos relés eletromecânicos de indução, propiciando painéis de comando e controle com menores dimensões. São constituídos de circuitos integrados dedicados a cada função desempenhada. Seus ajustes são realizados através de diais fixados na parte frontal do relé. Cada dial ajusta uma determinada função de proteção, tal como a corrente, o tempo, a tensão etc. A sinalização operacional é do tipo LED, normalmente nas cores vermelha e verde, instalada também na parte frontal do relé. Consomem pequena potência das fontes de alimentação, TCs e TPs, apresentam uma precisão elevada e simplicidade nos ajustes, além de elevada velocidade de operação. 

O relé eletrônico trouxe pouca inovação aos sistemas de proteção. Na prática, as funções de proteção desenvolvidas para os relés eletromecânicos, através de peças mecânicas e tecnologia de indução magnética, foram reproduzidas nos relés eletrônicos, utilizando-se agora circuitos impressos. Esses relés não apresentam padronização nas dimensões. A Figura 1.4 mostra um relé eletrônico muito utilizado no passado. 


1.5.3 Relés digitais 

Dominam totalmente o mercado. Com a automação cada vez mais crescente dos sistemas elétricos industriais e de potência, os relés digitais passaram a ser elementos obrigatórios nos esquemas de proteção. São constituídos de circuitos eletrônicos providos de chips de alta velocidade de processamento. Funcionam através de programas dedicados que processam as informações que chegam pelos transformadores de medida. Por meio de contatos externos são efetuados os comandos decididos pelo processo de avaliação microprocessado do relé. Seus ajustes são efetuados ou no frontal do relé por urna tecla de membrana por meio de instruções específicas ou através de um microcomputador conectado no frontal do relé por meio de uma comunicação serial RS 232. Não apresentam nenhuma padronização nas dimensões, até porque é impraticável, do ponto de vista funcional, operar. com relés de fabricantes diferentes ou até mesmo relés de mesmo fabricante porém com defasagem tecnológica. 

Os relés digitais revolucionaram os esquemas de proteção, oferecendo vantagens impossíveis de serem obti-das dos seus antecessores. Além das funções de proteção propriamente ditas, os relés digitais realizam funções de comunicação, medidas elétricas, controle, sinalização remota, acesso remoto etc. 

A Figura 1.5 mostra um relé digital de proteção de distância largamente empregado nos projetos de proteção de subestações de potência. 

1.6 CARACTERÍSTICAS DOS RELÉS DE PROTEÇÃO 

Apesar das conclusões que se podem tomar com base na análise de utilização dos relés que acabamos de descrever, estudaremos todos esses dispositivos com as diferentes tecnologias relacionadas, isto é, eletromecânica, eletrônica e digital, já que os profissionais de proteção, ainda por muitos anos, deverão trabalhar em diferentes sistemas elétricos, concebidos em épocas diferentes e com diferentes tecnologias.
 
1.6.1 Funções de proteção 

As funções de proteção e manobra são caracterizadas por um código numérico que indica o tipo de proteção a que se destina um relé. Um relé pode ser fabricado para atuar somente na ocorrência de um determinado tipo de evento, respondendo a esse evento de uma única forma. Um exemplo é o relé de sobrecorrente instantâneo do tipo indução, constituído apenas de uma unidade instantânea (função 50). Nesse caso, diz-se que o relé é monofunção. Outros relés, no entanto, são fabricados para atuar na ocorrência de vários tipos de evento, respondendo a esses eventos de duas ou mais formas. Um exemplo é o relé de sobrecorrente, constituído de uma unidade instantânea (função 50) e urna unidade temporizada (função 51), incorporando uma unidade de sub-tensão e outra de sobretensão. Nesse caso, diz-se que o relé é multifunção. 

Para padronizar e universalizar os vários tipos de funções foi elaborada uma tabela pela ANSI — American National Standards Institute — com a descrição da função de proteção e do código numérico correspondente. Esse código atualmente é aplicado em qualquer projeto de proteção no Brasil e em grande parte dos países, facilitando sobremaneira o entendimento pleno dos esquemas de proteção. A Tabela 1.4 reproduz os códigos numéricos das funções de proteção e manobra. Já a Tabela 1.5 reproduz a complementação da nomenclatura ANSI. 







1.6.2 Características construtivas e operacionais 

Os relés de proteção apresentam diversas características que particularizam a sua aplicação num determinado sistema, de acordo com os requisitos exigidos. Essas características podem ser agrupadas como descrito a seguir. 

1.6.2.1 Quanto à forma construtiva 

Os relés podem ser fabricados de diversas formas, cada uma delas utilizando princípios básicos peculiares. Em relação à forma de construção, podem ser classificados como:
 
• Relés fluidodinâmicos. 
• Relés eletromagnéticos. 
• Relés eletrodinâmicos. 
• Relés de indução. 
• Relés térmicos. 
• Relés eletrônicos. 
• Relés digitais. 

A seguir faremos uma breve exposição dos princípios básicos enumerados anteriormente, e os detalhes cons-trutivos serão abordados com maior profundidade nos itens pertinentes a cada unidade quando os estudarmos no Capítulo 3.
 
1.6.2.2 Relés fluidodinâmicos 

São relés que utilizam líquidos, em geral, o óleo de vaselina, como elemento temporizador. Normalmente são construídos para ligação direta com a rede e são montados nos polos de alimentação do disjuntor de proteção. Possuem um êmbolo móvel que se desloca no interior de um recipiente, no qual é colocada certa quantidade de óleo, que provoca a sua temporização quando o êmbolo é deslocado para fora do recipiente pela ação do campo magnético formado pela bobina ligada diretamente ao circuito a ser protegido. 

Não são mais fabricados desde que a NBR 14039 eliminou o seu uso como proteção principal de subestação de consumidor. No entanto, ainda é muito grande a quantidade desse tipo de relé em operação em pequenas e até em médias instalações industriais. Em geral, foram empregados na proteção de subestações de até 1000 kVA, sendo que muitas concessionárias limitavam sua aplicação a valores inferiores. 

Os relés fluidodinâmicos não foram utilizados pelas concessionárias de energia elétrica na proteção de su-as subestações de potência, em virtude da sua estreita possibilidade de coordenação com os elos fusíveis de proteção de rede. Outra limitação do seu uso foi quanto à inaplicabilidade de ser instalado ao tempo, situação característica das subestações das companhias de serviço público de energia elétrica. 

1.6.2.3 Relés eletromagnéticos 

O princípio de funcionamento de um relé eletromagnético se baseia na força de atração exercida entre elementos de material magnético. A força eletromagnética desloca um elemento móvel instalado no circuito magnético de modo a reduzir a sua relutância, conforme pode ser observado na Figura 1.6. 

O relé eletromagnético é constituído basicamente de uma bobina envolvendo um núcleo magnético, cujo entreferro é formado por uma peça móvel na qual é fixado um contato elétrico que atua sobre um contato fixo, permitindo a continuidade do circuito elétrico de acionamento do disjuntor. A referida peça móvel se desloca no sentido de permitir o menor valor de relutância no circuito magnético. 

No entanto, há outras formas de construção de relés eletromagnéticos. Existem aqueles providos de um êmbolo móvel que é deslocado pela força eletromagnética desenvolvida por uma bobina. Antes do advento e do-
 


mínio do mercado dos relés fluidodinâmicos para proteção de pequenas subestações, os eletromagnéticos eram largamente utilizados. Sua bobina é diretamente ligada ao circuito primário, estando em série com este, como pode ser visto na Figura 1.7. Nos modelos destinados à operação de disjuntores acionados por destrave mecânico direto, o êmbolo age por impacto mecânico sobre o dispositivo da trava. 

Para os dois tipos construtivos de relés eletromagnéticos, a sua operação é realizada pelo deslocamento do contato móvel, fixado numa haste móvel, fechando o contato fixo. 

1.6.2.4 Relés eletrodinâmicos 

Os relés eletrodinâmicos funcionam dentro do princípio básico de atuação de duas bobinas — uma móvel interagindo dentro de um campo formado por outra bobina fixa, tal como se constroem os instrumentos de medida de tensão e corrente conhecidos como os de bobina móvel. Na realidade, eles não têm aplicação notável como elementos de proteção de circuitos primários, apesar de sua grande sensibilidade. Por outro lado, apresentam um custo normalmente superior aos demais citados anteriormente. 

 
Seu princípio de funcionamento se baseia na passagem de uma corrente contínua, ou de uma corrente alter-nada retificada, através do circuito da bobina móvel, que está imersa em um campo magnético criado pela bo-bina fixa, podendo, no entanto, ser substituída por um ímã permanente. O movimento da bobina móvel é obtido pela interação entre os dois campos magnéticos que devem ter polaridades iguais, a fim de permitir a rotação desejada, de acordo com o princípio de que polos iguais se repelem, como pode ser visto na Figura 1.8.
 
1.6.2.5 Reles de indução 

Os relés de indução também são conhecidos como relés secundários, tendo sido largamente empregados em subestações industriais de potência e de concessionárias de serviço público, na proteção de equipamentos de grande valor econômico. 

Seu princípio de funcionamento é baseado na construção de dois magnetos, um superior e outro inferior, conforme mostrado na Figura 1.9, entre os quais está fixado, em torno do seu eixo, um disco de indução. Es-ses núcleos magnéticos permitem a formação de quatro entreferros, cada um sendo responsável pelo torque de acionamento do disco. O núcleo superior é dotado de dois enrolamentos. O primeiro é diretamente ligado ao circuito de alimentação, no caso um transformador de corrente, enquanto o outro é responsável pela alimentação do núcleo inferior. 

O disco de indução possui um contato, denominado contato móvel, que, com o movimento de rotação, atua sobre um contato fixo, fechando o circuito de controle. Uma mola de restrição força o retorno do disco de indu-ção à sua posição original, responsável pela frenagem eletromagnética, e seu ajuste é feito na instalação através de parafusos de ajuste. 

1.6.2.6 Relés térmicos 

Em geral, algumas máquinas, tais como transformadores, motores, geradores etc., sofrem drasticamente com o aumento da temperatura dos seus enrolamentos, o que implica a redução de sua vida útil e, consequentemente, falha do equipamento. Para se determinar o valor verdadeiro da temperatura no ponto mais quente de uma máquina, é necessário introduzir sondas térmicas no interior dos bobinados. Porém, apesar de sua eficiência, essas sondas passam a fazer parte do equipamento fisicamente, acarretando consequências indesejáveis de manutenção. 

No entanto, existem relés dotados de elementos térmicos ajustáveis, chamados de réplicas térmicas. Eles são atravessados pela corrente de fase do sistema, diretamente ou por meio de transformadores de corrente, e, através dos elementos térmicos com características semelhantes às características térmicas do equipamento que se quer proteger, atuam sobre o circuito de alimentação da bobina do disjuntor, desenergizando o sistema antes 


que a temperatura atinja valores acima do máximo permitido para aquela máquina em particular. Esses relés são chamados também de imagem térmica, por simularem a mesma curva de aquecimento do equipamento a ser protegido. 

1.6.2.7 Reles eletrônicos 

Os relés eletrônicos são fruto do desenvolvimento tecnológico da eletrônica dos, sistemas de potência. Na época em que eram fabricados atendiam a todas as necessidades de proteção dos sistemas elétricos, competindo em preço e desempenho com os modelos eletromecânicos, exceto em pequenos sistemas, quando se podiam utilizar os relés convencionais de ação direta, dispensando-se os transformadores de medida e as fontes auxiliares de alimentação. 

A tecnologia estática apresenta como vantagens adicionais sobre os relés convencionais eletromecânicos a compacidade, a precisão nos valores ajustados e a facilidade de modificação das, curvas de operação em uma mesma unidade.
 
1.6.2.8 Reles digitais 

É uma proteção baseada em técnicas de microprocessadores. Mantêm os mesmos princípios das funções de proteção e guardam os mesmos requisitos básicos aplicados aos relés eletromecânicos ou de indução e aos relés estáticos ou eletrônicos. No entanto, os relés digitais oferecem, além das funções dos seus antecessores, novas funções aos seus usuários adicionando maior velocidade, melhor sensibilidade, interfaceamento amigá-vel, acesso remoto, armazenamento de informações etc. 

Enquanto os relés eletromecânicos utilizam as grandezas analógicas da tensão e da corrente e contatos externos, bloqueios etc., denominados eventos, os relés digitais utilizam técnicas de microprocessamento. No en-tanto, as grandezas de entrada continuam sendo analógicas, e são convertidas internamente para sinais digitais através de conversores analógicos/digitais (A/D). 

Os relés digitais chegaram ao mercado brasileiro nos meados da década de 1980, porém nos anos 90 sua aplicação tomou um forte e definitivo impulso, à medida que a tecnologia de digitalização dos sistemas elétricos foi sendo cada vez mais aperfeiçoada e universalizada. 

Ao contrário dos relés eletromecânicos de indução e dos relés eletrônicos, os relés digitais, devido ao fato de operarem segundo uma programação inteligente e poderosa, têm a capacidade de processar digitalmente os valores medidos do sistema, tais como tensão, corrente, frequência etc., e de realizar operações lógicas e aritméticas. Além de exercer as funções dos seus antecessores tecnológicos, apresentam as seguintes vantagens: 

• Pequeno consumo de energia, reduzindo a capacidade dos transformadores de corrente. 
• Elevada confiabilidade devido à função de autossupervisão. 
• Diagnóstico de falha por meio de armazenamento de dados de falha. 
• Possibilidade de se comunicarem com um sistema supervisório, por meio de uma interface serial. 
• Possibilidade de serem ajustados à distância. 
• Durante os procedimentos de alteração nos ajustes, mantêm a proteção do sistema elétrico ao nível dos ajustes existentes. 
• Elevada precisão devido à tecnologia digital. 
•Amplas faixas de ajuste com vários degraus; ajuste dos parâmetros guiado por uma interface amigável. 
• Indicação dos valores de medição e dos dados de falha por meio de display alfanumérico. 
• Segurança operacional com a possibilidade de estabelecer uma senha do responsável pelo seu ajuste. 

A tecnologia analógica dos relés digitais pode ser resumida no fato de que os sinais analógicos de entrada são isolados eletricamente pelos transformadores de entrada dos relés, após o que são filtrados analogicamente e processados pelos conversores analógicos/digitais. 

Os relés digitais são dotados dos seguintes elementos de indicação e operação: 

a) Display (mostrador) alfanumérico 

É utilizado para mostrar os valores de medição e de ajuste, os dados armazenados na memória de massa e as mensagens que o relé quer transmitir. 

b) Teclas 

São utilizadas para ativar os parâmetros de medida a serem indicados e alterar o armazenamento desses parâmetros. 

Os relés digitais são caracterizados por três tipos de funções:
 
a) Funções de proteção 

São aquelas que monitoram as faltas e atuam em tempo muito rápido. São dotadas de larga faixa de medição, atuando em valores que podem atingir 20 vezes a grandeza nominal. Um exemplo de função de proteção é a proteção de sobrecorrente. 

b) Funções de medição 

São aquelas que exercem a supervisão do sistema elétrico. Algumas medições são registradas diretamente pelo relé, tais como tensão e corrente, enquanto outras são obtidas através de cálculos numéricos, tais como potência e fator de potência. A medição de corrente de um alimentador é um exemplo de função de medição.
 
c) Funções preditivas 

São aquelas que realizam as medições cumulativas de determinadas grandezas, tais como a duração do tempo de apuração, o número de operações de um disjuntor etc. 

Para melhor entendimento do relé digital é importante descrever as diferentes etapas de processamento das informações recebidas pelo mesmo por meio dos seus terminais de entrada, bem como os sinais enviados aos equipamentos de manobra e sinalização, e o resultado desse processamento deve ser comparado com valores pré-ajustados. 

a) Interface com o processo 

Há duas formas de o relé digital interfacear com o processo elétrico: 

• Condicionamento dos sinais 

Significa realizar a interface entre o processo elétrico e o ambiente eletrônico, isolando galvanicamente os referidos ambientes, a fim de evitar que as grandezas do sistema elétrico normalmente de valor elevado, tais como tensão e corrente, causem danos aos circuitos muito sensíveis do relé digital que operam com valores típicos de ±5 a ± 15 V. 

O relé digital é dotado de um conjunto de filtros analógicos cuja finalidade é reduzir os efeitos dos ruídos contidos nos sinais de entrada. Para determinadas funções, como, por exemplo, a proteção de sobrecorrente, o conjunto de filtros deixa passar apenas os sinais da frequência fundamental. 

O isolamento galvânico, citado anteriormente, é exercido nos relés digitais pelos transformadores de corrente e de potencial.
 
• Conversão dos sinais analógicos para digitais 

Realizado o acondicionamento do sinal, este deve ser convertido da forma analógica para a forma digital. 
Os relés contêm vários canais de entradas, CE, que alimentam no final o conversor analógico/digital, A/D. Sendo o conversor um componente de custo elevado, utiliza-se apenas uma unidade que tem a capacidade de converter um canal de cada vez. Assim, cada canal de entrada CE coleta uma amostra do sinal e o armazena analogicamente, utilizando, por exemplo, um capacitor, até que o conversor A/D possa obter uma representação numérica do mesmo. 

No circuito de conversão existe um elemento denominado multiplexador que tem a função de selecionar e ordenar o sinal que deve ser processado pelo conversor A/D. 

É interessante observar que os diferentes canais de entrada podem conter diferentes tipos de grandezas elé-tricas, como, por exemplo, correntes nas fases A, B, C e neutro ou as tensões nas fases A-B, B-C, C-A, fase e neutro e fase e mais uma tensão residual. 

Por sua vez, o conversor A/D realiza a conversão analógica da grandeza elétrica numa sequência numérica que é enviada aos microprocessadores.
 
b) Microprocessadores 

São elementos do relé que recebem os sinais digitais do conversor, além dos sinais digitais gerados natural-mente pelos contatos secos de chaves, contactores etc. e executam as funções de medição, proteção, controle etc. O resultado dessas operações é mostrado no display de cristal líquido do relé e/ou enviado para os canais de saída, representados por diodos de saída. 

Os microprocessadores também exercem a função de autossupervisão e comunicação serial. São operados por programas dedicados denominados algoritmos, responsáveis pela elaboração dos cálculos. 

c) Memória 

Os relés podem ser dotados de um ou mais tipos de memória: 

• Memória RAM (Random Access Memory) 

É aquela que armazena os dados variáveis de natureza temporária, tais como alarmes, correntes de atuação etc. Os dados armazenados podem ser eliminados da memória RAM quando da ausência da tensão auxiliar de alimentação do relé, sem que isso comprometa o desempenho da unidade. 

• Memória ROM (Read Only Memory) 

É aquela na qual é armazenado um conjunto de informações proprietárias do fabricante do relé. Esse tipo de memória somente pode ser acessado para a operação de leitura. 

• Memória PROM 

É uma memória ROM que pode ser programada eletricamente. • Memória EPROM É uma memória ROM que pode ser programada eletricamente várias vezes. Antes de qualquer regravação. seu conteúdo anterior é eliminado por meio de raios ultravioleta. 

• Memória EEPROM 

É uma memória PROM cujos dados armazenados podem ser eliminados eletricamente. Nesse tipo de memória, são armazenadas informações de caráter variável que não podem ser eliminadas com a ausência da tensão auxiliar, tais como energia acumulada, ajuste das proteções, contagem de eventos etc. 

• Memória FLASH 

Tem características semelhantes à memória EEPROM; no entanto, as informações podem ser eliminadas eletricamente, aplicando um determinado tipo de tecnologia. 

d) Entradas e saídas seriais 

São componentes do relé capazes de receber e enviar informações digitais, tais como mensagens operacio-nais, estado de operação do disjuntor etc. As entradas/saídas digitais normalmente empregadas nos relés são a RS 232 e a RS 485. 

e) Fonte de alimentação 

Os relés digitais necessitam de uma fonte de tensão operando em baixas voltagens para alimentar seus circuitos internos. A fonte de alimentação auxiliar normalmente utilizada é um banco de baterias provido de um retificador. Em geral, as tensões auxiliares mais empregadas são: 24 — 48 — 125 — 220 Vcc. A tolerância de variação da tensão auxiliar está compreendida entre 10 e 20%. 

f) Autos supervisão 

A fim de garantir a compatibilidade do sistema elétrico e do próprio dispositivo, os relés digitais são monitorados constantemente por um software dedicado que informa o estado dos diversos componentes que integram a unidade, ou seja, fonte de alimentação, processador, memórias etc. No caso da ocorrência de uma condição não favorável ao desempenho do relé, um alarme sonoro e/ou luminoso será emitido indicando a sua origem. 

Abordaremos mais à frente vários relés destinados à proteção de circuitos para diferentes perturbações, dentro dos princípios básicos de operação descritos anteriormente. 

g) Interface homem-máquina 

Normalmente, o relé é acompanhado de software que permite ao usuário, a partir de um microcomputador, comunicar-se facilmente com o dispositivo de proteção. A comunicação tem por objetivo introduzir e alterar os ajustes dos relés, acessar informações armazenadas e carregar tais informações para análise posterior. A fim de facilitar a solução para os usuários, normalmente os softwares oferecidos são executados em ambiente Windows. 

h) Relatório de falhas 

Os relés numéricos, em geral, são dotados de memória para armazenamento de eventos relacionados a eles próprios, além de informações sobre os últimos defeitos ocorridos no sistema elétrico que protege. Normalmente são armazenados os últimos 50 eventos relacionados aos relés, e o último evento após completada a memória de armazenamento anula o primeiro evento, e assim sucessivamente. 

1.6.3 Desempenho 

Todo e qualquer elemento de proteção deve merecer garantia de eficiência no desempenho de suas funções. 

Os relés de proteção devem apresentar os seguintes requisitos básicos quanto ao seu desempenho: 

• Sensibilidade. 
• Rapidez. 
• Confiabilidade. 

Os relés devem ser tão sensíveis quanto possível dentro de sua faixa de ajuste para a operação, pois, do contrário, a grandeza requerida para disparo da unidade poderá não fazer operar o mecanismo de atuação nos tempos desejados, provocando operações fora dos limites permitidos pelos equipamentos a proteger. 

Os relés também devem responder com extrema rapidez às grandezas elétricas para as quais estão ajustados, garantindo, desse modo, um tempo muito pequeno de duração do defeito. Não se deve confundir temporização voluntária de um relé com lentidão de seus mecanismos de operação. A primeira diz respeito à técnica de projeto de proteção que prevê, entre outras, a seletividade entre unidades do sistema. Já a segunda é própria das suas características construtivas. 

Todo sistema elétrico deve apresentar um grau de confiabilidade elevado. E, nesse particular, os relés são dispositivos que, por sua própria natureza e responsabilidade, devem ser extremamente confiáveis para todas as condições de perturbação do sistema para as quais foram dimensionados e ajustados. 

1.6.4 Grandezas elétricas 

Basicamente, um relé é sensibilizado pelas grandezas da frequência, da tensão e da corrente a que está sub-metido. Porém, tomando-se como referência esses valores básicos, é possível construir reles que sejam ajustados para outros parâmetros elétricos da rede, tais como impedância, potência, relação entre as grandezas anteriores etc. De modo geral, os relés podem ser assim classificados: 

• Relés de tensão. 
• Relés de corrente. 
• Relés de frequência. 
• Relés direcionais. 
• Relés de impedância. 

Em geral, os relés de tensão utilizam a própria tensão do sistema e comparam seu valor com aquele previamente ajustado para operação. O valor medido pode estar acima ou abaixo daquele tomado como referência, originando daí os relés de sobre e subtensão. 

Os relés de corrente são, na realidade, os mais empregados em qualquer sistema elétrico, tornando-se obrigatório o seu uso, devido à grande variação com que a corrente elétrica pode circular numa instalação, indo desde o estado vazio (corrente basicamente nula), passando pela carga nominal, atingindo a sobrecarga e, finalmente, alcançando o seu valor supremo, nos processos de curto-circuito franco. Nesses dois últimos casos, os danos à instalação são muito grandes, acarretando, inclusive, prejuízos ao patrimônio, com incêndios e destruição. Ao contrário da corrente, a tensão, de um modo geral, é estável, somente atingindo valores elevados quando ocorrem fenômenos normalmente externos à instalação, tais como descargas atmosféricas, perturbação na geração etc. Algumas exceções são as sobretensões advindas dos curtos-circuitos monopolares em sistemas isolados ou aterrados sob alta impedância, bem como as sobretensões resultantes de manobras de disjuntores. 

Os relés de frequência utilizam essa grandeza do sistema, comparando-a com o valor previamente ajustado para operação. Se há diferença, além dos valores prescritos no ajuste, o relé aciona o mecanismo de desligamento do disjuntor. 

Já os relés direcionais são acionados pelo fluxo de potência ou corrente que circula no sistema elétrico e que é levado ao seu sistema de processamento. Ora, como grandezas naturais, somente a tensão, a corrente e a frequência são parâmetros elétricos básicos. Para um relé direcional de potência, é necessário um par de bornes, sendo um de tensão e outro de corrente, para que se obtenha ó fluxo de demanda a cada instante. Os relés direcionais são de pouca utilização nas instalações industriais de pequeno e médio portes, chegando a ter aplicação obrigatória em instalações de grande porte supridas por duas ou mais fontes. Os relés atuam quando detectam o fluxo reverso de corrente ou de potência no ponto de sua instalação. 

Os relés de impedância utilizam como parâmetros elétricos a tensão e a corrente no ponto de sua instalação. Sabendo-se que a impedância, num determinado ponto do sistema, é a relação entre a tensão e a corrente, o relé de impedância nada mais afere do que o resultado desse quociente, para fazer atuar o seu mecanismo de acionamento. É largamente aplicado nos sistemas de potência das concessionárias de energia elétrica para a proteção de linhas de transmissão.
 
1.6.5 Temporização 

Apesar de se esperar a maior rapidez passível na atuação de um relé, normalmente, por questões de seletividade entre os vários elementos de proteção, é necessário permitir aos relés uma certa temporização antes que ordene a abertura do disjuntar. Logo, os relés podem ser classificados quanto ao tempo de atuação em: 

• Relés instantâneos. 
• Relés temporizados com retardo dependente. 
• Relés temporizados com retardo independente. 

Os relés instantâneos, como o próprio nome diz, não apresentam nenhum retardo intencional no tempo de atuação. O retardo existente é função de suas características construtivas, implicando certa inércia natural do mecanismo, temporizando assim sua atuação. Eles não se prestam à utilização em esquemas seletivos em que os valores das correntes de curto-circuito nos diferentes pontos são praticamente os mesmos. 

Os relés temporizados com retardo dependente são os mais utilizados em sistemas elétricos em geral. São caracterizados por uma curva de temporização normalmente inversa, cujo retardo é função do valor da grande-za que o sensibiliza. Esses relés apresentam uma família de curvas com as mais diversas declividades em razão das variadas aplicações requeridas na prática dos projetos de proteção. A Figura 1.10 mostra uma curva típica de um relé temporizado de retardo dependente, nesse caso específico evidenciando as correntes circulantes no ponto de sua instalação. Pode-se observar que quanto maior a corrente, menor o tempo de atuação, justificando a denominação temporização inversa. 

O relé temporizado com retardo independente, ao contrário do anterior, é caracterizado por um tempo de atuação constante, independentemente da magnitude da grandeza que o sensibiliza. A Figura 1.11 apresenta as 


curvas de um relé particular para operação por corrente. Podem ser ajustados, em geral, para vários tempos de atuação, dependendo das necessidades de um projeto de proteção específico. Como se pode observar pela figura, para os ajustes de corrente e tempo selecionados para uma determinada condição de operação do sistema fica definida a curva de atuação, como, por exemplo, a curva (A) disparando o relé independente do módulo da corrente, acima do valor ajustado. 

1.6.6 Forma de acionamento 

Os relés podem acionar os equipamentos de interrupção de dois diferentes modos, pelos quais são comumente conhecidos:
 
• Relés primários.
• Relés secundários. 

Os relés primários, também conhecidos como relés de ação direta, são largamente empregados na proteção de pequenas a médias instalações industriais. Apresentam a grande vantagem de, geralmente, dispensar trans-formadores redutores, pois estão diretamente ligados ao circuito que protegem, além de não necessitarem de fonte auxiliar para promoverem o disparo do disjuntor. São de fácil instalação e alguns modelos requerem certa manutenção preventiva, como no caso dos relés fluidodinâmicos, em que é importante manter o fluido temporizador isento de poeira e umidade excessiva, pois, do contrário, as suas características tornam-se sensivelmente alteradas. Alguns modelos pouco difundidos são alimentados por transformadores redutores, conservando, no entanto, a sua característica básica, que é o acionamento direto do disjuntor através de um mecanismo próprio e particular para cada tipo ou fabricante. 

A Figura 1.12 mostra o esquema básico de ligação de um relé primário para proteção de sobrecorrente. Essa forma de conexão pode ser vista em montagem na Figura 1.13, onde o relé está instalado diretamente no polo do disjuntor. 

Já a Figura 1.14 apresenta o esquema básico de conexão de um relé primário para proteção de sobrecorrente de haste articulada, alimentado através de transformador de corrente. Este último tem sua aplicação justificada quando as correntes de carga ou de curto-circuito são muito elevadas ou a tensão da rede requer uma isolação que pode comprometer a construção do relé. 

Os relés secundários, também conhecidos como relés de ação indireta, são amplamente empregados nas instalações de médio e grande portes. Apresentam custos sensivelmente mais elevados e necessitam de transfor-




madores redutores como fonte de alimentação, bem como requerem, em geral, uma fonte auxiliar de corrente contínua (mais utilizada) ou de corrente alternada. O investimento dessas unidades auxiliares torna o custo da proteção mais elevado. São empregados ainda na proteção de motores com potência superior a 200 cv. Em geral. os relés secundários apresentam maior confiabilidade que os demais, além de possuírem ajustes bem mais precisos e curvas de temporização bem mais definidas. Como o próprio nome sugere, esse tipo de relé não atua diretamente sobre o mecanismo de acionamento do disjuntor. Apenas, quando opera, propicia o fechamento dos contatos do circuito da bobina do disjuntor que estão ligados a uma fonte auxiliar, geralmente de corrente contínua. Essa fonte normalmente é constituída por um conjunto de baterias permanentemente ligado a um retificador de alimentação. Atualmente são utilizados disjuntores com bobina de abertura alimentada por capacitor que substitui o retificador/carregador e o banco de baterias, o que reduz substancialmente o custo desse tipo de proteção, até porque a NBR 14039 eliminou o uso dos relés primários de ação direta na proteção geral de subestações de média tensão. 

A Figura 1.15 mostra um esquema de uma proteção com relés secundários,, detalhando todas as unidades necessárias ao conjunto. Nesse caso, os contatos dos relés estão ligados em paralelo, de sorte que, em caso de defeito em qualquer uma das fases, a bobina de abertura do disjuntor é energizada pelo banco de baterias. 

A Figura 1.16 mostra esquematicamente uma proteção com relés secundários em que os contatos dos mesmos estão ligados em série e intertravados mecanicamente por meio de uma haste isolante, de sorte que, em caso de defeito em qualquer uma das fases, a bobina de abertura do disjuntor é energizada pelo banco de baterias, fechando simultaneamente os contatos dos três relés. Nesse caso, a bobina de abertura do disjuntor opera desenergizada. 

Já a Figura 1.17 mostra o mesmo relé anterior, com a bobina do disjuntor operando energizada. 

A Figura 1.18 mostra esquematicamente um relé secundário de tensão (sub ou sobretensão), energizado por um conjunto de transformadores de potencial. Nesse caso, os contatos dos relés secundários estão ligados em paralelo. 

Os relés secundários apresentados nas Figuras de 1.12 a 1.18 têm características de atuação instantânea. No entanto, existem outros modelos, como será visto oportunamente, em que as bobinas são substituídas por um disco de indução que permite a temporização do disparo, ajustando o comprimento do arco percorrido pelo contato móvel, fixado no referido disco. No entanto, para aplicação industrial em média tensão, atendendo à norma brasileira de instalações de média tensão, NBR 14039, a fonte para energização da bobina de abertura do disjuntor deve ser constituída por uma fonte externa. A Figura 1.19 apresenta um disjuntor de média tensão a vácuo, provido de uma unidade de proteção incorporada com as funções 50, 51, 50 N e 51 N de fabricação ABB, de larga utilização em subestações industriais e comerciais. Nesse caso, a fonte de energia para a atuação da bobina de abertura do disjuntor é um capacitor. O disjuntor poderá ser fornecido também com outras funções de proteção incorporadas. A Figura 1.20 mostra os detalhes construtivos de um disjuntor próprio para operação com relés secundários providos de bobinas de abertura e fechamento. 

Os disjuntores utilizados para operação com relés primários apresentam características construtivas bastante diferentes dos disjuntores utilizados com relés secundários. Enquanto os primeiros mostrados na Figura 1.13 







apresentam um mecanismo simples com hastes articuladas fixadas entre os terminais mecânicos dos relés e a haste de acionamento do disjuntor, o segundo tipo de disjuntor opera por meio de mecanismos acionados por bobinas denominadas bobina de abertura e bobina de fechamento, conforme mostrado na Figura 1.20. 

1.7 TIPOS DE PROTEÇÃO DOS SISTEMAS ELÉTRICOS 

Cada componente de um sistema elétrico é especificado em função das condições operativas desse sistema no qual irá funcionar, de forma que suas características técnicas não sejam superadas. 

Os sistemas elétricos estão sujeitos permanentemente a eventos que devem ser controlados, monitorados ou simplesmente eliminados. 

Para que se possa operar um sistema elétrico com o maior grau de confiabilidade é necessária a utilização de um conjunto de proteções, cada uma específica para um determinado evento. A seguir estudaremos, de forma resumida, os principais tipos de proteção para os eventos de maior ocorrência. 

1.7.1 Proteção de sobrecorrentes 

Sobrecorrentes são os eventos mais comuns que ocorrem nos sistemas elétricos de forma geral. Também submetem os componentes elétricos aos maiores níveis de desgaste e comprometimento de sua vida útil. As sobrecorrentes podem ser classificadas, quanto a dois diferentes níveis, em sobrecargas e curtos-circuitos. 

1.7.1.1 Sobrecargas 

São variações moderadas da corrente que flui no sistema elétrico. Se ocorrerem limitadas no seu módulo e no tempo, não prejudicam os componentes elétricos do sistema. Muitas vezes, o sistema elétrico já é projetado para permitir sobrecargas por tempo limitado, como é o caso dos transformadores de potência que, dependendo da carga anterior à sobrecarga, podem suportá-la por um longo período de tempo. Também há sobrecargas que devem ser toleradas, já que são inerentes à operação do sistema elétrico. É o caso da partida dos motores elétricos de indução, cuja corrente de partida assume valores muito elevados e que devem ser tolerados pelos dispositivos de proteção dentro dos limites de suportabilidade dos motores e dos demais componentes do sistema elétrico. 

Quando o valor da corrente de sobreecarga ultrapassa os limites permitidos de qualquer dos componentes de um sistema elétrico, o valor da corrente deve ser reduzido ou o equipamento retirado de operação. 

Os dispositivos mais utilizados para a proteção contra os eventos de sobrecarga são os relés térmicos. Também são utilizados outros tipos de relés: eletromecânicos, eletrônicos e digitais com temporizações moderadas. 

1.7.1.2 Curtos-circuitos 

Os curtos-circuitos são variações extremas da corrente que flui no sistema elétrico. Se não forem limitados no seu módulo e no tempo, danificam os componentes elétricos por meio dos quais são conduzidos. Enquanto os tempos permitidos nos eventos de sobrecarga podem chegar a vários segundos (tempo de rotor travado po-de ser tolerado, por exemplo, até aproximadamente 15 segundos, dependendo das características do motor), os tempos permitidos para a duração dos curtos-circuitos não devem superar o valor de 2 segundos. Normalmente, devem ser limitados entre 50 e 1000 ms. Para tanto, os dispositivos de proteção devem ser extremamente velozes e os equipamentos de manobra, no caso os disjuntores e religadores, devem ter capacidade adequada para operar em condições extremas de corrente. 

Os equipamentos de manobra anteriormente citados devem possuir as duas seguintes características básicas de interrupção das correntes de curto-circuito: 

a) Capacidade de interrupção 

É a corrente máxima que o equipamento de manobra deve ser capaz de interromper em condições definidas por documentos normativos e está relacionada à tensão, à frequência natural do sistema, à relação )UR, ao ci-clo de operação etc. 

b) Capacidade de fechamento em curto-circuito 

Os equipamentos de manobra, a princípio, devem ter o mesmo valor da capacidade de fechamento em curto-circuito do que a capacidade de interrupção. Em casos específicos, a capacidade de fechamento em curto-circuito deve ser superior à capacidade de interrupção. 

Os dispositivos mais utilizados para a proteção contra os eventos de curto-circuito em baixa e média tensão (redes de distribuição) são os fusíveis. Nos sistemas de potência os relés são os dispositivos mais utilizados na eliminação dos curtos-circuitos e podem ser eletromecânicos, eletrônicos e digitais, todos eles graduados com temporizações muito pequenas. 

1.7.2 Proteção de sobretensões

 Os sistemas elétricos de potência têm como limite a tensão máxima de operação durante a ocorrência de uma falta. Considerando o restabelecimento do sistema para o regime permanente, os valores de tensão máxima não devem superar o valor de 110% da tensão nominal. Se a tensão do sistema superar o valor limite de 110% do valor nominal, os relés de sobretensão, atuação instantânea e temporizada, devem ter os seus dispositivos adequados de proteção atuando sobre os disjuntores. 

As sobretensões podem aparecer nos sistemas elétricos por meio de diferentes origens, ou seja: 

• Descargas atmosféricas. 
• Chaveamento. 
• Curtos-circuitos monopolares. 

1.7.2.1 Sobretensões por descargas atmosféricas 

As sobretensões por descarga atmosférica são um evento que pode envolver todas as fases do sistema ou somente uma fase. 

Ao longo dos anos, várias teorias foram desenvolvidas para explicar o fenômeno dos raios. Atualmente, tem-se como certo que a fricção entre as partículas de água e gelo que formam as nuvens, provocada pelos ventos ascendentes de forte intensidade, dão origem a uma grande quantidade de cargas elétricas. Verifica-se experimentalmente que as cargas elétricas positivas ocupam a parte superior da nuvem, enquanto as cargas elétricas negativas se posicionam na sua parte inferior, gerando, consequentemente, uma intensa migração de cargas positivas na superfície da terra para a área correspondente à localização da nuvem. 

Dessa forma, a concentração de cargas elétricas positivas e negativas numa determinada região faz surgir uma diferença de potencial entre a nuvem e a terra. No entanto, o ar apresenta uma determinada rigidez dielétrica, normalmente elevada, e que depende de certas condições ambientais. 

O aumento dessa diferença de potencial, que se denomina gradiente de tensão, poderá atingir um valor que supere a rigidez dielétrica do ar, interposto entre a nuvem e a terra, fazendo com que as cargas elétricas negativas migrem na direção da terra, num trajeto tortuoso e normalmente cheio de ramificações, cujo fenômeno é conhecido como descarga piloto. É de aproximadamente 1 kV/mm o valor do gradiente de tensão para o qual a rigidez dielétrica do ar é rompida. 

A ionização do caminho seguido pela descarga piloto propicia condições favoráveis de condutibilidade do ar ambiente. Mantendo elevado o gradiente de tensão na região entre a nuvem e a terra, surge, em função da aproximação do solo de uma das ramificações da descarga piloto, uma descarga ascendente, constituída de cargas elétricas positivas, denominada descarga de retorno. 

Não é possível precisar a altura do encontro entre esses dois fluxos de carga que caminham em sentidos opostos, mas acredita-se que seja a poucas dezenas de metros da superfície da terra. 

Ao atingir a nuvem, a descarga de retorno provoca, numa determinada região da mesma, uma neutralização eletrostática temporária. Na tentativa de manter o equilíbrio dos potenciais elétricos no interior da nuvem, surgem intensas descargas que resultam na formação de novas cargas negativas na sua parte inferior, dando início a uma nova descarga da nuvem para a terra, tendo como canal condutor aquele seguido pela descarga de retorno que em sua trajetória ascendente deixou o ar intensamente ionizado. 

As descargas reflexas ou secundárias podem acontecer repetidas vezes após cessada a descarga principal. 

Constatou-se também que 90% das descargas atmosféricas têm polaridade negativa. Isso é importante para determinar o nível de suportabilidade dos equipamentos às tensões de impulso. 

As redes aéreas podem ser submetidas às sobretensões devidas às descargas atmosféricas de forma direta ou indireta. 

Sobretensões por descargas diretas 

Quando uma descarga atmosférica atinge diretamente uma rede elétrica desenvolve-se uma tensão elevada que pode superar o nível de isolamento da mesma, seguindo-se um defeito monopolar, o mais comum, ou tripolar. 

As redes aéreas de média e baixa tensão são mais afetadas pelas descargas atmosféricas do que as redes aéreas de nível de tensão mais elevado, devido ao baixo grau de isolamento dessas redes. Por exemplo, enquanto a tensão suportável de impulso de uma linha de transmissão de 230 kV é de 1.050 kV, uma rede de distribuição de 13,80 kV apresenta uma suportabilidade de apenas 95 kV. Assim, uma corrente de descarga de 5 kA provocará uma sobretensão de 1.750 kV numa rede de distribuição, cuja impedância característica é de 350 ohms, superando aproximadamente 18 vezes sua tensão suportável de impulso. Essa mesma sobretensão numa linha de transmissão de 230 kV não seria tão severa quanto na rede de distribuição. 

As descargas diretas apresentam uma taxa de crescimento da tensão na faixa de 100 a 2.000 kV/µs. 

Para evitar a descarga diretamente sobre a rede elétrica são projetados sistemas de blindagem tais como cabos para-raios, denominados cabos guarda, instalados acima dos condutores vivos da linha, ou para-raios atmosféricos de haste normalmente instalados nas estruturas das subestações de potência. A blindagem criada em torno da rede permite limitar a magnitude das sobretensões. 

As redes aéreas de distribuição primárias e secundárias de áreas urbanas são protegidas naturalmente contra as descargas atmosféricas diretas por meio de objetos próximos tais como edificações, árvores e outras linhas em paralelo, todos com altura igual ou superior a altura dos condutores das referidas redes. Essas blindagens naturais contra as descargas diretas não impedem as sobretensões induzidas decorrentes das descargas sobre os objetos próximos, anteriormente mencionados. 

1.7.2.1.2 Sobretensões por descargas indiretas induzidas 

Quando uma descarga atmosférica se desenvolve nas proximidades de uma rede elétrica, são induzidas uma determinada tensão nos condutores de fase e, em consequência, uma corrente associada, cujos valores são funções da distância do ponto de impacto, da magnitude da corrente da descarga etc. No entanto, se a rede elétrica for dotada de uma blindagem com cabos para-raios, eles serão os condutores que ficarão sub-metidos à tensão induzida e à corrente associada. Devido às capacitâncias próprias e mútuas entre os con-dutores de blindagem e os condutores vivos, é desenvolvida nos condutores uma onda de tensão acoplada. 

A Figura 1.21 mostra uma estrutura de linha de transmissão protegida contra descargas atmosféricas através de cabos-guarda. 

A impedância no pé da torre influi na tensão no topo da torre, devido às ondas de reflexão. 

As descargas atmosféricas cujo ponto de impacto é próximo às redes aéreas podem induzir uma tensão nessas redes cujo valor não supera o valor de 500 kV. Tratando-se de redes com tensão nominal superior a 69 kV ou dotadas de cabos para-raios para blindagem, o seu nível de isolamento é compatível com os valores das sobre-tensões induzidas, não acarretando falha nas isolações. No entanto, redes aéreas com tensão nominal igual ou inferior a 69 kV podem falhar por tensões induzidas. As redes de 69 kV, por exemplo, apresentam uma tensão suportável de impulso (TSI) para surtos atmosféricos de 355 kV. 

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