Paulo H. GuadagniniI, Vania E. BarletteII
Universidade Estadual do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil
Centro Universitário Franciscano, Santa Maria, RS, Brasil
RESUMO
Neste trabalho, descrevemos o projeto e funcionamento de um sistema eletrônico simples de leitura direta de temperatura que utiliza um termistor como elemento sensor. O sistema é composto de uma fonte de alimentação estabilizada, um circuito série contendo um resistor e um termistor, e um circuito de condicionamento de sinal contendo um único circuito integrado, e pode ser operado com uma bateria. O sistema possui exatidão da ordem de 0,1 ºC para a faixa de temperatura de 0 ºC a 32 ºC, sendo indicado para experimentos que envolvem medidas de pequenas variações de temperatura. O sistema também apresenta algumas características adicionais, como robustez, facilidade de construção, baixo custo, e resposta rápida a variações de temperatura.
1. Introdução
Medidas de temperatura são fundamentais em pesquisa e desenvolvimento em ciências e tecnologia, pois grande parte das propriedades físicas e químicas apresentam alguma dependência com a temperatura. Também, medidas de temperatura são fundamentais em controle de processos em que a temperatura é uma variável importante. Vários aparatos de medida de temperatura vem sendo desenvolvidos, utilizando dispositivos sensores elétricos e não elétricos, em busca de leituras mais exatas para a finalidade a que se destinam.
Neste trabalho, apresentamos o projeto e funcionamento de um termômetro eletrônico de leitura direta, robusto e de fácil construção, que utiliza um termistor de pequenas dimensões. O sistema proposto inclui um circuito de condicionamento de sinal com um único circuito integrado de baixo custo. As leituras de temperatura compreendem uma faixa de trabalho entre 0 ºC a 32 ºC e são efetuadas diretamente em um multímetro comum de 3 dígitos, sendo de fácil visualização para qualquer disposição do sensor. A resolução do instrumento é de 0,1 ºC, e a exatidão obtida, na maior parte da faixa de temperatura de trabalho, é de 0,1 ºC, sendo uma alternativa especialmente adequada para medidas de pequenas variações de temperatura. O sistema proposto pode ser utilizado em um grande número de experimentos de física e físico-química experimental, podendo-se citar estudos experimentais de propriedades físicas e comportamento de gases, determinação de propriedades termodinâmicas para processos físicos e químicos, e medidas da variação de temperatura em mudanças de estado físico.
Uma discussão sobre o uso de elementos sensores de temperatura, bem como os conceitos sobre condicionamento de sinal que podem ser utilizados com sensores, é apresentada por Horowitz e Hill, Baker e por Michalski et al. Entretanto, propostas de construção e operação de termômetros de precisão utilizando sensores elétricos com aplicação no ensino não são facilmente encontradas na literatura. Kirkup e Tonthat utilizaram um diodo como elemento sensor na construção de um termômetro de leitura direta para uma faixa de temperatura de trabalho entre 0 ºC a 100 ºC. Entretanto, o circuito eletrônico por eles sugerido é mais complexo comparado ao circuito apresentado aqui, além de ser necessária uma fonte de alimentação simétrica para a operação do equipamento, e ainda, a exatidão obtida é de aproximadamente 2 ºC, o que pode comprometer algumas aplicações. Pode-se dizer que a presente proposta consiste em uma inovação para o ensino de física, uma vez que tradicionalmente termômetros que utilizam termistores não fazem parte das aulas experimentais em nível de graduação ou em nível médio, embora termistores como elementos sensores de temperatura sejam comumente encontrados em equipamentos de uso doméstico, industrial e de pesquisa, e apresentem vantagens comparativamente aos termômetros de líquido-em-vidro e termômetros de termopares que serão discutidas aqui.
2. Projeto, construção e operação do termômetro
2.1. Linearização da resposta do termistor
Dentre os sensores elétricos de temperatura, os termistores do tipo NTC (Negative Temperature Coefficient) são dispositivos semicondutores, de baixo custo, que exibem um coeficiente negativo de resistência elétrica com a temperatura, e são utilizados para medidas de temperatura entre –50 ºC e +300 ºC, bem como para medidas precisas de pequenas variações de temperatura em experimentos calorimétricos. Os termistores destinados a medidas de temperatura usualmente possuem pequena massa e dimensões, facilitando seu posicionamento no meio em que se deseja efetuar a medida. Essas características físicas, juntamente com o tipo de resposta a ser correlacionada com a temperatura, que é uma resposta elétrica, confere ao termistor a dupla vantagem de proporcionar medidas de variações rápidas de temperatura e minimizar trocas de calor entre o termistor e o corpo que se deseja medir a temperatura.
Os termistores podem possuir encapsulamento em epóxi ou em vidro, sendo este último mais apropriado para efetuar medidas em líquidos contendo substâncias que podem danificar o sensor. O encapsulamento em vidro também confere ao termistor maior estabilidade de suas características ao longo do tempo, pois limita a difusão de líquidos e gases através da sua superfície. A Fig. 1 mostra o aspecto físico de termistores como o utilizado no termômetro aqui proposto.
O comportamento da resistência elétrica em função da temperatura para um termistor NTC típico não é linear, o que exige a aplicação de alguma estratégia de linearização de sua curva característica, que pode ser descrita aproximadamente como
em que R é a resistência elétrica do termistor à temperatura absoluta T, e A e B são constanstes características do termistor.
Várias alternativas foram propostas para efetuar a linearização da resposta de um termistor para faixas definidas de temperaturas utilizando circuitos eletrônicos analógicos (linearização no domínio analógico). Para a linearização da resposta do termistor, utilizamos um divisor de tensão que é constituído por um termistor, um resistor e uma fonte de tensão de excitação constante, conforme o esquema elétrico indicado na Fig. 2. Segundo Hoge, a capacidade de linearização desse circuito série é igual a de outras topologias, tal como a ponte de Wheatstone com um termistor e três resistores fixos. A tensão de saída da rede resistiva, vs, indicada na Fig. 2, apresenta um comportamento sigmoidal. O ponto de inflexão da sigmóide ocorre quando a resistência do termistor é aproximadamente igual à resistência do resistor fixo. No projeto aqui proposto, foi escolhido um resistor de valor nominal de 10 kW, uma vez que foi considerado de interesse que o ponto de inflexão da curva sigmoidal ficasse próximo a 25 ºC, e a esta temperatura o termistor tem valor nominal de 10 kW. A tensão de saída, vs, dependerá inversamente da temperatura de modo aproximadamente linear para uma faixa de temperatura limitada.
2.2. Curva de Calibração
Para determinar a faixa de temperatura em que a resposta do circuito é aceitavelmente linear, efetuamos determinações da tensão vs em função da temperatura, utilizando um multímetro e um termômetro de líquido-em-vidro como sendo o termômetro padrão. O termistor e o termômetro padrão foram mergulhados em um banho de água em que a temperatura do banho foi variada continuamente entre 0 ºC (mistura de água e gelo) e 80 ºC, sob agitação suave da água do banho. Foi determinado que o circuito apresentou uma resposta linear para temperaturas entre 0 ºC e 40 ºC, como indicam os dados experimentais mostrados na Fig. 3. A curva de calibração do termômetro foi obtida a partir de um ajuste linear pelo método de mínimos quadrados aos dados experimentais de temperatura e tensão, obtendo-se coeficiente de correlação de –0,9999 e equação de reta
em que t é a temperatura do banho em equilíbrio com o termistor, em graus Celsius, vs é dada em Volts, v0 = 0,6741 V e b = 0,00932 V ºC–1. A Fig. 3 apresenta a correlação linear obtida por regressão linear (Eq. 2). A curva de calibração obtida foi utilizada como base para o projeto da etapa de condicionamento de sinal, como descrito a seguir.
2.3. Condicionamento de sinal
Para o condicionamento de sinal do termômetro de leitura direta que se deseja, considerou-se o problema básico de obter a tensão de saída após o condicionamento de sinal, vc, a partir de vs (Eq. 2), tal que
Um circuito baseado em um amplificador operacional pode ser utilizado para efetuar tal condicionamento de sinal, de acordo com o esquema apresentado na Fig. 4. O circuito em questão deverá ser projetado para gerar a tensãovc a partir de vs, de modo a satisfazer as Eqs. (2) e (3).
Na análise de circuitos contendo amplificadores operacionais, pode-se utilizar o modelo do amplificador operacional ideal. Nesse modelo, as impedâncias das entradas inversora(–) e não-inversora(+) do amplificador operacional são infinitas, implicando em correntes de entrada nulas. Na prática, esse modelo descreve satisfatoriamente o circuito do projeto proposto no presente trabalho, que utiliza um amplificador operacional com corrente de entrada da ordem de 45 nA [7]. Pode-se considerar, inicialmente, uma configuração mais simples do que a mostrada na Fig. 4, em que a entrada não-inversora do amplificador operacional é ligada diretamente no terminal negativo da fonte de alimentação, implicando, portanto, na eliminação da bateria. Aplicando o modelo do amplificador operacional ideal para esse caso, em que a tensão de entrada é aplicada na entrada inversora, a nova tensão de saída, vc1, pode ser expressa por
em que RF e RS são, respectivamente, as resistências dos resistores RF e RS. Nessa configuração, o amplificador operacional opera como inversor com ganho –RF/RS. Por outro lado, o modelo do amplificador operacional ideal também pode ser utilizado para expressar a tensão de saída quando a tensão de entrada é aplicada na entrada não-inversora. Pode-se considerar uma segunda configuração, mais simples que a indicada na Fig. 4, em que o terminal esquerdo do resistor RS é ligado no terminal negativo da fonte, e não mais a vs. Nesse caso, a tensão de entrada torna-se a própria tensão da bateria, vref, e a nova tensão de saída é expressa como
em que vref é a tensão de referência aplicada na entrada não-inversora do amplificador operacional. Nessa configuração, o amplificador operacional opera como não-inversor com ganho (1 + RF/RS).
Para analisar o circuito de condicionamento de sinal utilizado neste trabalho, mostrado esquematicamente na Fig. 4, pode-se aplicar o princípio da superposição, válido para circuitos lineares. Segundo esse princípio, a tensão de saída pode ser expressa como a soma das tensões de saída devido a cada uma das duas configurações descritas pelas Eqs. (4) e (5),
Substituindo-se as Eqs. (2) e (3) na Eq. (6), determina-se a razão entre as resistências RF e RS,
e a tensão de referência,
Fixando RF = 1 MW, obtém-se RS = 932 kW e vref = 0,349 V.
2.4. Construção do termômetro
A Fig. 5 apresenta o esquema elétrico do termômetro, incluindo a fonte de alimentação, o circuito série contendo o termistor e o resistor, e o circuito de condicionamento de sinal. Para a operação do equipamento, um regulador de tensão 7805 (CI1) é utilizado para estabilizar a tensão em 5 V. O regulador de tensão pode ser alimentado com uma bateria de 9 V ou com uma fonte de alimentação regulada para tensão entre 9 V e 12 V.
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O termômetro utiliza o circuito integrado de baixo custo LM358, que possui internamente dois amplificadores operacionais (CI2a e CI2b) os quais foram projetados especificamente para operar com fontes de alimentação simples e com baixo consumo de energia. A escolha desse circuito integrado confere maior simplicidade ao circuito, pois não há necessidade de se utilizar duas baterias ou um circuito adicional para gerar tensões positivas e negativas em relação a um ponto comum.
O termistor é um sensor que exige uma corrente de excitação, e portanto gera energia térmica que tende a aumentar a sua própria temperatura, podendo comprometer a exatidão das medidas. No modo de trabalho descrito acima, o termistor deve ser operado em uma condição de dissipação de potência desprezível, o que implica que o auto-aquecimento do termistor, devido à corrente de excitação, seja desprezível. Na prática, recomenda-se que a corrente de excitação não seja maior que 100 mA para que variações de temperatura da ordem de 0,1 ºC possam ser medidas com confiabilidade. O divisor de tensão formado pelo termistor RT e pelo resistor R3 é alimentado pela tensão de excitação obtida do amplificador operacional CI2a, que é utilizado como buffer (ganho unitário). O valor da tensão de excitação é definido pelo divisor de tensão formado pelos resistores R1 e R2, sendo aproximadamente 0,90 V. Esse valor de tensão de excitação resulta em correntes de excitação do termistor de 22 mA, para a temperatura de 0 ºC, de 45 mA, para a temperatura de 25 ºC, e de 58 mA, para a temperatura de 40 ºC, segundo medidas experimentais efetuadas. A constante de dissipação típica, no ar, para termistores de dimensões daquelas mostradas na Fig. 1, é cerca de 1 mW ºC^-1 (elevado a -1). Pode-se estimar, com base nesse valor, a variação de temperatura no termistor devido à corrente de excitação. Considerando que a resistência do termistor, a 25 ºC, é de 10 kW, a potência dissipada é de 20 mW, resultando em uma variação de temperatura no termistor de 0,02 ºC devido ao auto-aquecimento, o que é consideravelmente inferior à resolução que se pretende que o termômetro tenha, que é de 0,1 ºC. Como ocorre um máximo para a potência dissipada no termistor no ponto de inflexão da curva representada na Fig. 2, para qualquer outra temperatura diferente de 25 ºC, a potência dissipada no termistor será inferior a 20 mW. Para outros meios, como por exemplo óleo ou água sob agitação, a constante de dissipação do termistor pode tornar-se até dez vezes maior, reduzindo a influência da corrente de excitação na medida de temperatura.
A queda de tensão entre os terminais do termistor é introduzida na entrada inversora do amplificador operacional CI2b, que é utilizado para o condicionamento de sinal conforme a Eq. (6). Os resistores R4 e R5 em série, na Fig. 5, equivalem ao resistor RS, na Fig. 4. Foram utilizados os valores comerciais para resistências de R4 e R5 que resultam no valor aproximado de RS calculado anteriormente. O resistor de realimentação R6, na Fig. 5, equivale ao resitor RF na Fig. 4. O divisor de tensão constituído pelo potenciômetro R7 define a tensão de referência, vref, que pode ser ajustada para efetuar a calibração do termômetro. Esse potenciômetro deve ser, preferencialmente, do tipo multivoltas. O resistor R8 proporciona uma corrente de saída mínima do amplificador operacional CI2b, o que permite que a tensão na saída de CI2b fique abaixo de 1 mV quando a temperatura do termistor é de 0 ºC.
A tensão de saída de CI2b (lida no multímetro), em volts, multiplicada por 100, representa o valor numérico da temperatura em graus Celsius, conforme a Eq. (3). Por exemplo, para a tensão de saída de 0,255 V, a temperatura será de 25,5 ºC. Dessa maneira, é possível ler diretamente o valor da temperatura no multímetro acoplado na saída do circuito. Para tal, utiliza-se um fundo de escala que inclua 3 e meio dígitos na leitura de tensão e que seja compatível com os valores a serem medidos (entre 0 e 0,450 V). Nos multímetros comuns, o fundo de escala mais adequado geralmente é o de 2 V.
Alguns pontos devem ser salientados, com respeito à construção do termômetro:
1. Resistores de carbono podem ser usados na construção do termômetro. Entretanto, deve-se optar preferencialmente por resistores de filme metálico (especialmente no caso de R3), pois estes possuem menor coeficiente de variação de resistência com a temperatura;
2. O circuito proposto não será danificado caso haja curto circuito entre a saída de CI2b e o ponto comum. Entretanto, isso deve ser evitado, pois o tempo de vida da bateria pode ser reduzido;
3. Para ligação do termistor ao circuito, pode-se utilizar um par de fios flexíveis de cerca de 40 cm de comprimento de modo que o termistor possa ser posicionado adequadamente no experimento em questão;
4. Para facilitar a conexão elétrica da saída do circuito do termômetro com os bornes do multímetro, pode-se utilizar cabos para pontas de prova com plugues banana na extremidade a ser conectada no multímetro;
5. Os componentes eletrônicos podem ser montados em uma placa de circuito especialmente projetada ou em uma placa universal;
6. Há necessidade de se isolar hermeticamente os terminais metálicos do termistor, principalmente quando ele é imerso em soluções eletrolíticas (que possuem íons dissolvidos).
2.5. Calibração do termômetro
Para a calibração do termômetro, foi utilizada a temperatura de 0 ºC e uma temperatura intermediária da faixa de interesse (0 ºC a 40 ºC), próxima a 20 ºC. O procedimento sugerido para a calibração é o seguinte:
1. Inicialmente, ajusta-se a tensão na entrada não inversora de CI2b (pino 3) para o valor calculado de 0,349 V (Eq. 8), utilizando-se o potenciômetro R7;
2. Mergulha-se o termistor em uma mistura em equilíbrio de gelo e água, e ajusta-se a leitura para 0 ºC (0,000 V) utilizando-se o potenciômetro R7;
3. Mergulha-se o termistor em água entre 20 ºC e 25 ºC, e, usando-se o potenciômetro R7, ajusta-se a leitura para a temperatura do banho, que deverá ser medida com o termômetro padrão posicionado próximo ao termistor;
4. Mergulha-se o termistor novamente na mistura em equilíbrio de gelo e água e ajusta-se a leitura para 0 ºC, caso necessário, utilizando-se o potenciômetro R7;
5. Verifica-se a calibração, usando-se o termistor e o termômetro padrão imerso em água entre 20 ºC e 25 ºC. Caso seja necessário, pequenos ajustes devem ser efetudos no potenciômetro R7, verificando-se novamente a calibração para 0 ºC.
Quando o termistor for substituído, recomenda-se efetuar uma nova calibração, iniciando-se pela etapa 2.
3. Testes realizados e discussão
Na Fig. 6 são apresentados os dados experimentais de temperatura medidos utilizando-se o termômetro padrão de líquido-em-vidro, tp, em função dos dados medidos com o termômetro eletrônico de leitura direta, tld. A reta mostrada faz um ângulo de 45º com o eixo das abscissas, e pode ser utilizada para facilitar a verificação da concordância dos dados. Para a obtenção dos dados graficados na Fig. 6, o termômetro foi calibrado segundo o procedimento descrito acima, nas temperaturas de 0 ºC e 20 ºC. O termômetro padrão e o termistor foram mergulhados em um banho contendo água termostatizada sob agitação suave e a temperatura foi variada de 0 ºC a 43 ºC, obtendo-se um total de 33 pontos experimentais. Foi calculado o erro absoluto médio (média aritmética das diferenças |tld – tp|) de 0,09 ºC para um total de 23 pontos experimentais na faixa de temperatura de 0 ºC a 32 ºC. Os erros absolutos mínimo e máximo foram, respectivamente, 0 ºC e 0,2 ºC. A partir de 33 ºC, o erro absoluto aumenta progressivamente, atingindo o valor máximo de 1,8 ºC à temperatura de 43 ºC. Com base nesses resultados, estabelecemos a faixa de temperatura de trabalho do termômetro como sendo de 0 ºC a 32 ºC, o que implica em uma exatidão estimada de aproximadamente 0,1 ºC para medidas efetuadas nesta faixa.
No projeto de um termômetro, usualmente existem fatores conflitantes que devem ser ponderados, tais como a faixa de temperatura de trabalho e a exatidão. Em geral, a exatidão é reduzida quando se prioriza uma faixa de temperatura de trabalho maior. No caso do termômetro proposto aqui, a prioridade foi obter exatidão de 0,1 ºC, às custas da redução da faixa de temperatura para cerca de 32 ºC (0 ºC a 32 ºC). Estratégias de linearização da resposta do termistor diferentes das utilizadas aqui permitem expandir essa faixa de temperatura de trabalho, mas com maior custo, complexidade do circuito e/ou do processo de calibração e de dificuldade de construção. Para tal, podem ser utilizados linearização por software (no domínio digital), circuitos configurados com dois ou mais termistores, chaves para trocas do resistor fixo que fica em série com o termistor e circuitos com amplificadores logarítmicos.
Caso o termistor seja danificado, ele pode ser substituído facilmente e a um baixo custo. Para avaliar a variabilidade das leituras de temperatura quando o termistor é substituído por outro de mesmo modelo e fabricante, foram efetuadas leituras de temperatura substituindo-se o termistor original, sem modificar a calibração. Em uma amostra de 4 termistores testados, a maior diferença de temperatura encontrada foi de 0,2 ºC, indicando boa concordância de características entre os sensores. Entretanto, como não se pode assegurar a mesma concordância em todos os casos, recomenda-se efetuar o procedimento de calibração quando da troca do termistor para maior exatidão das medidas.
A fonte de alimentação do termômetro utiliza o regulador de tensão integrado 7805 que fornece na sua saída a tensão nominal de 5 V. O valor exato da tensão não é importante para o funcionamento do termômetro, mas sua estabilidade sim. Caso haja flutuações ou deriva da tensão ao longo do tempo, as tensões nas portas não inversoras de CI2a e CI2b serão afetadas, alterando artificialmente o valor da temperatura indicada. Segundo medidas experimentais efetuadas com o termômetro em funcionamento, o coeficiente de variação da indicação de temperatura em relação à tensão de alimentação regulada é de aproximadamente 0,005 ºC/mV. Outras medidas experimentais mostraram que a variação de tensão de saída do regulador 7805, nas condições de uso aqui e com a bateria com boas condições de carga, não ultrapassa 10 mV. Variações dessa magnitude ocorrem nos primeiros dois minutos de funcionamento do termômetro. Após esse período de tempo, as variações de tensão usualmente permanecem abaixo de 1 mV. Portanto, espera-se uma variação na temperatura indicada pelo termômetro, nos primeiros dois minutos de funcionamento, de no máximo 0,05 ºC devido a variações na tensão de saída do regulador de tensão.
A utilização do sistema aqui proposto em atividades de ensino do termômetro eletrônico de leitura direta proposto apresenta vantagens significativas do ponto de vista prático em relação aos termômetros de líquido-em-vidro e de termopares. Inicialmente, deve-se considerar que o termômetro proposto apresenta uma resposta mais rápida em relação ao termômetro convencional de líquido-em-vidro, o qual utiliza o volume do líquido como propriedade termométrica. Ainda, devido ao volume e massa reduzidos do sistema aqui apresentado, e ao fato da leitura requerida ser efetuada em um multímetro, um termistor apresenta-se mais adequado para uso em recipientes fechados (tal como em um calorímetro), pois minimizam-se as trocas de calor com o ambiente externo. Para efetuar leituras em um recipiente fechado ou em locais de difícil visualização com um termômetro de líquido-em-vidro, é necessário, muitas vezes, retirar parcialmente o termômetro da posição, o que resulta em dificuldades de leitura e em erro nas medidas, especialmente se o termômetro de líquido-em-vidro utilizado tem resolução da ordem de 0,1 ºC. Deve-se considerar, também, que o termômetro de líquido-em-vidro é frágil, o que resulta em quebras freqüêntes durante as aulas práticas. A utilização do sistema proposto minimiza esse problema devido à robustez de sua construção. Para aplicações em que resolução da ordem de 0,1 ºC é requerida, o termômetro eletrônico proposto apresenta também vantagens com respeito à maioria dos termômetros baseados em termopares que são utilizados em laboratórios de ensino. Termômetros de termopares apresentam exatidão típica de 1 ºC, como ocorre nos que equipam a maioria dos multímetros que possuem a função de termômetro, sendo pouco disponíveis os termômetros de termopares com resolução da ordem de 0,1 ºC, o que os torna inadequados para alguns tipos de aplicações que envolvem medidas de pequenas variações de temperatura, como por exemplo medidas calorimétricas. Ainda, para a construção de termômetros de termopares, há necessidade de um circuito eletrônico de condicionamento de sinal relativamente complexo comparado ao circuito proposto aqui. Por outro lado, os termômetros de termopares são mais adequados a trabalhos experimentais que necessitam de uma faixa de temperatura de trabalho maior e/ou a possibilidade de medir temperaturas elevadas (várias centenas de graus Celsius).
4. Comentários finais
À saída do termômetro proposto pode ser facilmente acoplado um sistema digital de aquisição de dados ou um sistema analógico do tipo registrador potenciométrico, o que permite o registro dos dados de temperatura em função do tempo para posterior análise e tratamento de dados. Uma possível aplicação prática para tal recurso é a obtenção dos perfis de temperatura em determinações calorimétricas que utilizam calorímetros isoperibólicos. Finalmente, com base nas informações apresentadas neste trabalho, é possível reprojetar o divisor de tensão contendo o termistor e o circuito de condicionamento de sinal para deslocar a faixa de temperaturas de trabalho para outra região de interesse.
Referências
[1] L. Michalski, K. Eckersdorf, J. Kucharski and J. McGhee, Temperature Measurement (John Wiley, England, 2001), 2nd edition, p. 103. [ Links ]
[2] P. Horowitz and W. Hill, The Art of Electronics (Cambridge University Press, Cambridge, 1989), 2nd edition, p. 1125. [ Links ]
[3] B.C. Baker, Thermistors in Single Supply Temperature Sensing Circuits (Microchip Technology Inc., 1999). [ Links ]
[4] L. Kirkup and C. Tonthat, Phys. Educ. 33, 302 (1998). [ Links ]
[5] L. D. Hansen and R.M. Hart, Thermochinica Acta 417, 257 (2004). [ Links ]
[6] H.J. Hoge, Rev. Sci. Instrum. 50, 316 (1979). [ Links ]
[7] LM158/LM258/LM358/LM2904 Low Power Dual Operational Amplifiers (National Semiconductor Corparation, 2002). [ Links ]
[8] G. Rizzoni, Principles and Applications of Electrical Engineering (McGraw Hill, 2000), 3th edition. [ Links ]
[9] R.K. Chakravarty, K. Slater and C.W. Fischer, Rev. Sci. Instrum. 48 (1977). [ Links ]
Um comentário:
Olá, por favor verifique as unidades de medida, pois 5V/20k não dá mA!!!
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